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Plano Real, 20 anos: Moeda trouxe novo ciclo de desenvolvimento econômico

Quem nasceu no final dos anos 1990 não acompanhou os desdobramentos acarretados por uma troca de moeda no Brasil, que afetou não só a economia, mas a vida cotidiana das famílias brasileiras. A implantação da nova moeda, o Plano Real, que completou 20 anos em 2014, buscava equilibrar a inflação no período e iniciar um novo ciclo de desenvolvimento econômico.
No início daquela década, o Brasil vivia um cenário econômico de superinflação. Por atingir valores altos, a inflação chegou a ser apelidada de “dragão” e atingiu seu ápice em 1993, com 2700%, segundo números do IGP-DI (índice de preços da FGV). A variação nos preços tornou famosa a máquina de remarcar preços, que etiquetava os produtos com novos valores mais de uma vez por dia, em algumas ocasiões.
Plano Real sucedeu uma sequência de planos econômicos (veja mais sobre os planos no final do texto) que não surtiram efeitos e levaram ao aumento da inflação (o objetivo era justamente o contrário), crise de abastecimento nos mercados, demissões, entre outras consequências. Em comum, esses planos, lançados entre os governos dos presidentes José Sarney (entre 1985-1990) e Fernando Collor de Mello (entre 1990-1992), apostavam no congelamento de preços e salários, medida que se mostrou ineficaz contra a inflação.

A inflação antes do Plano Real

Para entender o papel do Plano Real, é válido ressaltar que em 1993 a inflação atingia 2700% no país e, após a implantação da nova moeda, o valor da inflação média dos governos seguintes manteve-se em 12,6% (Fernando Henrique Cardoso) e 6,3% (no governo Lula). Pelo Índice Geral de Preços (IGP), constata-se que foi a partir de 1958 que o aumento descontrolado da inflação começou no Brasil, com índices anuais superiores a 30%. O auge aconteceu em 1964, quando a inflação atingiu 86%.
No governo do presidente João Baptista Figueiredo (1979-1985), por exemplo, a inflação alcançava números altos: o menor índice registrado no período foi de 94% (em 1981). Entre 1987 e 1993, os brasileiros conheceram o monstro da hiperinflação. Em sete anos ela ultrapassou 1.000% cinco vezes.
Depois do impeachment do presidente Collor, em 1992, seu vice Itamar Francoassumiu a presidência do país, que vivia uma situação econômica delicada, refletida na troca constante de ministros da Fazenda (foram três em sete meses). A principal promessa da nova moeda era, então, conter a temível inflação.

Plano Real buscava estabilizar a inflação

Oficialmente, o real tornou-se a 10ª moeda brasileira no dia 1º de julho de 1994, já no governo do presidente Itamar Franco e com Fernando Henrique Cardoso (FHC) como ministro da Fazenda. No entanto, o planejamento para a troca do cruzeiro real, a moeda anterior -- 2.750 cruzeiros reais (CR$) seriam convertidos em R$ 1 – para o real tinha começado um ano antes.
Ficou definido que o plano seria implantado em três etapas para evitar o congelamento de preços e o aumento da inflação, como ocorrera em tentativas anteriores. A primeira foi o ajuste das contas públicas por meio de um corte no Orçamento. Em agosto de 1993, FHC comunicou o corte de três zeros na moeda vigente, o cruzeiro (Cr$), e anunciou o lançamento do cruzeiro real (CR$ 1 = Cr$ 1.000). Era a quarta mudança monetária no Brasil em sete anos. A manobra foi uma espécie de preparação para o real, que já estava criado, mas só seria colocado em operação em julho do ano seguinte.
A segunda etapa consistiu na implantação provisória da Unidade Real de Valor (URV), que ficou em vigor de março a julho de 1994 e era uma espécie de moeda de troca, usada para converter os valores das mercadorias. Como era atrelada à taxa de câmbio (relação entre moedas de dois países que resulta no preço de uma delas medido em relação à outra; no Brasil a moeda estrangeira mais negociada é o dólar americano), era protegida da inflação.
A moeda provisória funcionava da seguinte maneira: cada real era equivalente a uma URV, que valia 2.750 cruzeiros reais. Os preços das mercadorias passaram a ter valores em URV, mas a moeda que circulava nas ruas ainda era o cruzeiro real. Todos os dias o Banco Central anunciava a taxa de conversão entre as moedas. Com isso, foi possível uniformizar os reajustes de preços, de câmbio e dos salários de maneira desvinculada do cruzeiro real.
Para a população, na prática, funcionava assim: ao escolher um produto no mercado, ele estava com o preço em URV nas prateleiras, mas ao passar o caixa, o valor era convertido e pago em cruzeiros reais. Na época, a URV valia um dólar (US$) e, assim, o real também começou cotado a US$ 1. O papel da URV foi promover a dolarização da economia sem que fosse necessário abnegar a moeda nacional.

A implantação e os resultados

A partir de 1º de julho de 1994, foi colocada em marcha a fase final do plano, com um novo ministro da fazenda, Rubens Ricupero (FHC havia deixado o cargo para se candidatar à presidência da República). Chegara a hora da URV ser substituída pelo real, e para controlar a inflação, o governo passava a ter como instrumentos os juros altos e o dólar barato, com câmbio praticamente fixo.
Entretanto, a paridade do real com o dólar (que era de R$ 1 para US$ 1) provocou insatisfação em alguns setores da indústria. A abertura comercial e a manutenção do câmbio valorizado como medidas para manter a inflação controlada causaram um efeito colateral: as importações passaram a ser estimuladas obrigando as empresas nacionais a diminuírem os preços para entrar na concorrência.
Apesar de outras crises externas que vieram posteriormente, o Plano Real conseguiu manter a inflação dentro de níveis aceitáveis. A partir de 1999, o Banco Central criou o regime de metas para a inflação. A Selic (Sistema Especial de Liquidação e de Custódia), que determina o nível básico de juros na economia, passou a ser a âncora monetária, substituindo o controle do câmbio, que passou a ser flutuante (quando a compra e venda de moedas não tem controle sistemático do governo).

Outros planos anteriores não deram certo

Até se chegar à implantação do Plano Real, outras tentativas foram feitas para acabar com a escalada dos preços entre o final dos anos 1980 e início da década de 1990:
1986, Plano Cruzado: durante o governo de José Sarney, o Plano Cruzado chegou para reduzir a inflação por meio de uma reforma monetária. Foi implantado o Cruzado (Cz$) no lugar do Cruzeiro (Cr$). Houve também um congelamento de preços, e o governo convocou as pessoas a denunciarem os lugares que não seguissem os preços tabelados, episódio que ficou conhecido como “Fiscais do Sarney”. Mas o tiro saiu pela culatra, ocasionando uma crise de abastecimento nos mercados e, consequentemente, o fracasso do Plano Cruzado.
1987, Plano Bresser: na época, era Luiz Carlos Bresser-Pereira quem ocupava o cargo de ministro da Fazenda. Ele foi o responsável pelo plano que visava controlar a inflação e o déficit público com medidas como o congelamento de preços e o adiamento de grandes obras. Mais uma tentativa sem sucesso.
1989, Plano Verão: encabeçado pelo então ministro da fazendo Maílson da Nóbrega, o Plano verão também estabeleceu o congelamento dos preços e anunciou uma nova moeda, o Cruzado Novo. Sem sucesso, foi o terceiro a fracassar na tentativa de controlar a inflação.
1990, Plano Collor: sob a presidência de Fernando Collor de Mello, a moeda brasileira passava a ser Cruzeiro e trazia novamente o congelamento de preços e salários. A ministra da Fazenda da época, Zélia Cardoso de Mello, optou por confiscar a poupança dos cidadãos, o que significava que todos os depósitos em contas correntes ficaram limitados a 50 mil cruzados. Todo o resto das economias pessoais foi bloqueado por 18 meses. 

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